domingo, 26 de agosto de 2012

Os Últimos Dias na Terra - Parte V

Relâmpagos. Vendavais assustadores. Chuva a cair de forma ininterrupta e violenta. Sons hediondos de objetos a rodopiarem com a força assustadora da espiral. Com frequência ouvi árvores a serem quebradas, estrépitos que reproduziam em mim arrepios que me percorriam todo o corpo e, pior que tudo isso, a imagem de que quando ousasse abrir a porta da cave iria encontrar tudo irremediavelmente destruído não me abandonava a mente. Perdi a noção de quanto tempo estávamos ali, inertes, confinados a um cubículo que embora fosse o nosso único ádito nos próximos dias ou meses, não substituía o lar que tanto me tinha custado a construir. 
Afago o cabelo a Ava que dormita com a cabeça apoiada nas coxas de Ben. Tal como eu, ele permanece acordado, talvez cogitando sobre como será a nossa vida daqui para a frente. Talvez ele esteja tão sorumbático quanto eu, apesar de não o demonstrar. Olha para mim, estende a mão em direção ao meu rosto e acaricia-o, esticando-se para pousar os seus lábios na minha testa. Não o repilo. 
– Dá-me a tua mão, Kim. Vamos a Barcelona num instante. – Diz ele num gracejo.
Dou-lhe a mim mão, enlaçando os meus dedos nos seus.
– Eu vejo um dia solarengo. Níveis de precipitação muito baixos, o vento sopra de Noroeste e a ondulação é baixa. Vejo-te a usar aquele vestido sem costas verde com um estampado ridículo mas que te fica ridiculamente bem. Ava está mais à frente, apontando para um Centro Comercial que entretanto avista. Nós entramos e ela persuade-me a dar-lhe um livro. Como estou feliz, não recuso. – Arfa. – E tu? Como me vês?
Fecho as minhas pálpebras e deixo a imaginação envolver-me.
– Sem t-shirt a exibir os teus abdominais e a tentar irritar-me a segredar-me que uma mulher olhou para ti. – Sorrio. – Depois abraças-me e dizes que nem que fosse a Angelina Jolie me trocarias por ela e eu fico feliz e  beijas-me desenfreadamente. Vejo Ava a reproduzir um esgar por ver-nos a agir como adolescentes e tu desatas a correr atrás dela. Ela tenta ultrapassar-te, mas continuas veloz como uma gazela. Vejo-vos depois a correrem e a deixarem-me para trás, mesmo sabendo que os meus dotes de atletismo são escassos ou até mesmos inexistentes. Corro até vocês e agradeço-vos por serem parte de mim.
Ambos abrimos os olhos. Vejo uma lágrima deslizar pelo rosto de Ben. Ele apressa-se a limpá-la com o polegar. Finjo não a ver. 
– Então, gostaste da nossa viagem? 
– Sim, gostei. Tem algo de verídico. – Respondo, tentando não acordar Ava.
– Tu sabes que podemos não fazer essa viagem, não sabes? – Pergunta ele, desolado.
Anuo. Claro que sei. Ele não se esforçou por me assolapar isso e ainda bem.
– Não te preocupes, nós vamos consertar tudo. Apenas temos de nos unir. Todos os sobreviventes, quero eu dizer.
Ben puxa-me para si e pousa os seus lábios nos meus. Depois encosta a sua testa à minha e deixa escapar mais umas lágrimas. Desta vez sou eu que as limpo. Dou-lhe um beijo na bochecha e ele abre os olhos azuis, fitando-me com candura. Sinto o meu coração amolecer-se e quero abraçá-lo, mas ele impede-me. Pretende acordar Ava e levantar-se. 
Há já algum tempo que não se faz ouvir o ruído do furacão. Claro que se ouve, mas parece bem distante. Ben levanta-se, fita o relógio e enverga um casaco de penas. Deambula pela cave e minutos depois faz-se portar de um martelo. Ava brinca com ele por só lhe faltar a capa para se assemelhar ao Thor, já que era louro e alto como ele. Ben contrapõe que já não são precisas mais tempestades.
Começa a trepar até chegar à porta e começa a empurrá-la, contudo esta não se abria por nada deste mundo. Estávamos presos. Ava subiu e ajudou-o a pressionar o martelo, mas a porta só se moveu um pouco. Resolvi subir. Três pessoas seriam melhor que duas. Depois de grande esforço, a porta escancara-se, deixando uma forte massa de ar frio abater-se sobre nós. Ben empoleira-se e vê em primeira mão o cenário que o envolve. Não resisto a espreitar. 
Destruição. É tudo o que consigo vislumbrar. A nossa casa está em pantanas. Vidros partidos, paredes demolidas, tudo numa reviravolta total. A fachada frontal está destruída e permite-nos ver o panorama da rua que é semelhante ao da nossa casa. Destruição massiva. Àrvores espraiadas nas ruas e edifícios. Carros amolgados, ao contrário e até mesmo com pessoas lá dentro no término da rua. A casa vizinha foi invadida por uma árvore de grande porte e por um carro. Outras já só restam os escombros. O céu encontra-se apocalíptico e o vento ainda assombra a região. Não consigo controlar as lágrimas que caiem em catadupa. Ben abraça-me e recolhe-me para o interior. Ava ainda continua a observar a destruição.
– Vamos ficar bem, Kim. Temos de ser egoístas por vezes.
Não consigo parar de soluçar. O abraço de Ben não me consegue acalmar. Ouço algo a rachar e sustenho instintivamente a respiração. Segundos depois vejo Ava a cair das escadas e a estatelar-se no chão. 

5 comentários:

  1. Nya*, eu quero saber o que aconteceu! Algo Alien? Pessoas de outro planeta? Oh c'mon , please *.*
    Estou a adorar, como sabes.

    ResponderEliminar
  2. Tenho mesmo de ver o filme! Sim, comigo faziam o mesmo! Eu também adoro descobrir bandas novas, que ninguém ouve, mas a verdade é que que acabam por ficar conhecidas, mas desde que não apareçam na rádio, por mim tudo bem ;)

    ResponderEliminar
  3. então suponho que seja este :) bem, claro que não. e tu também nunca pares. obrigada mais uma vez! beijinho*

    ResponderEliminar
  4. Só tenho uma coisa a dizer-te: CONTINUA :D

    ResponderEliminar

"Procura o que escrever, não como escrever." Séneca
Aviso: Não se aceitam comentários que não se relacionem com o post. Obrigada pela compreensão.