sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Indo Embora


O quarto, os livros na estante desgastados de tantas releituras, a cama onde foram compartilhados os melhores momentos, nada mais parecia o mesmo.
O adolescente moreno claro que sorria ao meu lado no porta-retrato em um dos cantos de destaque da estante, também não parecia o mesmo.Não, não é que não parecia. Já não era mesmo mais o mesmo há muito tempo. O amor quase de infância, o seu sorriso dócil, sua gargalhada espontânea e o brilho de seus olhos, tal como seu modo carinhoso de tratar-me, nunca mais foram os mesmos.Ainda me é muito difícil de admitir a mim mesma que pessoas mudam radicalmente e, pessoas que amamos, por mais que repitam incansavelmente a palavra “amar”, já não mais o demonstram em atitudes.Luciano era assim. Enquanto calava esta frase que todos aguardam por ouvir sem cansar-se, demonstrava em suas atitudes comigo. Sua dedicação quando eu adoecia, suas mensagens no telemóvel de preocupação quando por algum motivo em nada especial faltava ao colégio, seu carinho em meu rosto e o beijo morno em minha testa que dizia tudo. Tudo o que precisava ouvir, sem precisar ouvir.Mas agora estava tudo diferente. Quando adoeço, sou motivo de estorvo, por mais que disfarce, fica claro em seu semblante. Meu telemóvel já só recebe mensagens de amigos e parentes próximos, o sexo tornou-se um hábito como escovar os dentes, rápido, simples e automático e o beijo na testa... não recordo do último dia em que o recebi. Mas a frase “eu te amo”, esta, está sempre lá.Não posso, não posso continuar. O Luciano que conheci mudou ou alguma outra pessoa, a qual desconheço completamente, tomou seu lugar.Olho pela última vez seu retrato sorrindo, evidentemente, não para mim, pego a minha mochila com meus poucos pertences e dou-lhe as costas. Tal qual aqueles livros da estante, minha vida necessita uma releitura.

Mirei o meu relógio de pulso e vi que faltava pouco mais de uma hora para ele abandonar o seu emprego e voltar para casa. De qualquer das formas, não notava muito a diferença quando ele permanecia em casa: ambos andávamos tão desencontrados e distantes que parecíamos autênticos desconhecidos. Mirei um outro retrato na tela exposta na parede da sala e suspirei, sentindo-me um tanto nostálgica com um laivo de descontentamento. Detive-me e larguei a mochila mas as imagens dilacerantes, imagens que me impossibilitavam de ficar, que me impossibilitavam sequer de amar alguém que não me amava, voltavam sem pedir permissão, acabando por me dar uma coragem extra para bater a porta com força e conduzir em direcção a nenhures.
Não tinha um rumo definido, nunca o tivera e talvez por esse facto a minha relação com Luciano tenha sido um ato catastrófico. Mal entrei no carro senti o cheiro inebriante do seu perfume: uma promíscua mistura de odores frescos mas bastante agradável. Cerrei o meu punho fazendo-o embater contra o volante.Soltei um grito de angústia, revolta e uns tantos sentimentos que eram demasiado apocalípticos. Tinha de sair dali. Tinha de reescrever capítulos bons na minha vida e não mais capítulos repletos de apatia, insegurança e degredo. Precisava de algo que me assegurasse o ânimo e deixá-lo parecia ser a única luz ao fundo do túnel.O facto mais curioso da vida é que nós idealizamos uma vida, ansiamos em tê-la e, quando finalmente a obtemos, tudo parece demasiado irreal, não correspondente à suposta realidade que a nossa mente tinha construído, reinando, assim, um sentimento semelhante ao vácuo espacial: acaba por não existir nada para além de nós e acabamos por viver apenas para nós quando nada resulta como queremos. E, ao fim de uns tantos quilómetros percorridos, de tantas lágrimas derramadas, de tantos gritos silenciados, apercebi-me que apenas estava a viver para mim e que o que aconteceu no passado com Luciano não passou de uma mera brincadeira onde ambos fomos os joguetes do destino.E de que isso me servia viver sem amor nem ser amada? Não valia sequer. Provavelmente o ato mais nobre seja terminar. 


Texto escrito por: Christian V. Louis e Hayley Nya




Novo capítulo de Setembro já disponível.

9 comentários:

  1. Ah juntaram-se para escrever :) Gostei muito !

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  2. Gostei gostei! Está demais! Parabéns ;)

    Não consigo seguir o teu blog! Ajuda-me pf!

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  3. quero seguir mas é com a outra conta! (porque com esta já sigo)

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  4. De nada ;)

    O problema é que não consigo perceber o que sinto, estou tão á toa :|

    beijinho!

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  5. estava eu a fazer os tpc's até que me lembro de repente "ui, eu não respondi ao comentário da nya! :o" ahah :D

    Ora bem, é normal que saibas a razão pela qual eu escrevi aquele texto, tu conheces-me de ginjeira! E para além disso, pensas da mesma forma que eu e estás comigo quase todos os dias, o que é muitooo bom! (:

    E sim, a piu-piu vai conseguir, só precisa de mais força nos braços e de mais treino =)

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"Procura o que escrever, não como escrever." Séneca
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